Cientistas só podem ver até uma determinada distância, até alcançarem a borda do universo. Será que algum dia saberemos se existe algo além?
Texto: Nationalgeographic
O que está além das margens do
universo observável? É possível que nosso universo seja apenas um de muitos em
um multiverso muito maior?
Os filmes não se cansam de
explorar essas questões. De blockbusters de super-heróis como Doutor Estranho
no Multiverso da Loucura ao queridinho indie Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo
– com data de estreia no Brasil prevista para 23 de junho –, as histórias de
ficção científica estão cheias de realidades alternativas. E, dependendo de
qual cosmólogo você perguntar, o conceito de um multiverso é mais do que pura
fantasia.
“Nossa compreensão da realidade
não está completa, muito pelo contrário”, diz o físico da Universidade de
Stanford, nos Estados Unidos, Andrei Linde. “A realidade existe
independentemente de nós.”
Se eles existem, esses universos
estão separados do nosso, inalcançáveis e indetectáveis por qualquer
medição direta (pelo menos até agora). E isso faz com que alguns especialistas
questionem se a busca por um multiverso pode ser verdadeiramente científica.
Os cientistas um dia terão
certeza se o nosso universo é o único? Nós quebramos as diferentes teorias
sobre um possível multiverso – incluindo outros universos com suas próprias
leis da física – e se muitas versões de você poderiam existir por aí.
O que é um multiverso?
O multiverso é um termo que os
cientistas usam para descrever a ideia de que além do universo observável,
outros universos também podem existir. Os multiversos são previstos por várias
teorias científicas que descrevem diferentes cenários possíveis – desde regiões
do espaço em planos diferentes do nosso universo, até universos-bolha separados
que estão constantemente surgindo.
A única coisa que todas essas
teorias têm em comum é que elas sugerem que o espaço e o tempo que podemos
observar não são a única realidade.
Ok… mas por que os cientistas
pensam que pode haver mais de um universo?
“Não podemos explicar todas as
características do nosso universo se houver apenas uma delas”, diz o jornalista
científico Tom Siegfried, cujo livro The Number of the Heavens (O número de
céus, em tradução livre) investiga como as concepções do multiverso evoluíram
ao longo de milênios.
“Por que as constantes
fundamentais da natureza são o que são?”, Siegfried se pergunta. “Por que há
tempo suficiente em nosso universo para fazer estrelas e planetas? Por que as
estrelas brilham do jeito que brilham, com a quantidade certa de energia? Todas
essas coisas são perguntas para as quais não temos respostas em nossas teorias
físicas.”
Siegfried diz que existem duas
explicações possíveis: primeiro, que precisamos de teorias mais novas e
melhores para explicar as propriedades do nosso universo. Ou, diz ele, é
possível que “sejamos apenas um dos muitos universos que são diferentes, e
vivemos naquele que é agradável e confortável”.
Quais são algumas das teorias
mais populares do multiverso?
Talvez a ideia mais aceita
cientificamente venha do que é conhecido como cosmologia inflacionária, que é a
ideia de que nos momentos após o Big Bang, o universo se expandiu rápida e
exponencialmente. A inflação cósmica explica muitas das propriedades observadas
do universo, como sua estrutura e a distribuição das galáxias.
“A princípio, essa teoria parecia
uma peça de ficção científica, embora muito imaginativa”, diz Linde, um dos
arquitetos da teoria inflacionária cósmica. “Mas isso explicava tantas
características interessantes do nosso mundo que as pessoas começaram a levá-la
a sério.”
Uma das previsões da teoria é que
a inflação poderia acontecer repetidamente, talvez infinitamente, criando uma
constelação de universos-bolha. Nem todas essas bolhas terão as mesmas
propriedades que as nossas – podem ser espaços onde a física se comporta de
maneira diferente. Alguns deles podem ser semelhantes ao nosso universo, mas
todos existem além do reino que podemos observar diretamente.
Quais são as outras ideias?
Outro tipo atraente de multiverso
é chamado de interpretação dos muitos-mundos da mecânica quântica, que é a
teoria que descreve matematicamente como a matéria se comporta. Proposta pelo
físico Hugh Everett em 1957, a interpretação de muitos-mundos prevê a presença
de linhas de tempo ramificadas ou realidades alternativas nas quais nossas
decisões se desenrolam de maneira diferente, às vezes produzindo resultados
totalmente distintos.
“Hugh Everett diz: veja, na
verdade há um número infinito de Terras paralelas, e quando você faz um
experimento e obtém as probabilidades, basicamente tudo o que prova é que você
vive na Terra onde esse foi o resultado desse experimento”, diz o físico James
Kakalios, da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, que escreveu sobre
a física (ou não) dos super-heróis. “Mas em outras Terras, há um resultado
diferente.”
De acordo com essa interpretação,
versões de você poderiam estar vivendo as muitas vidas possíveis que você
poderia ter levado se tivesse tomado decisões diferentes. No entanto, a única
realidade que é perceptível para você é aquela em que você habita.
Então, onde todas essas outras Terras existem?
Elas estão todas sobrepostas em
dimensões que não podemos acessar. Max Tegmark do Instituto de Tecnologia de
Massachusetts (MIT) refere-se a esse tipo de multiverso como um multiverso de
Nível III , onde vários cenários estão se desenrolando em realidades
ramificadas.
“Na interpretação de
muitos-mundos, você ainda tem uma bomba atômica, só não sabe exatamente quando
ela vai explodir”, diz Linde. E talvez em algumas dessas outras realidades,
não.
Por outro lado, os múltiplos
universos previstos por algumas teorias da inflação cósmica são o que Tegmark
chama de multiverso de Nível II, onde a física fundamental pode ser diferente
nos diferentes universos. Em um multiverso inflacionário, diz Linde, “você nem
sabe se, em algumas partes do universo, bombas atômicas são possíveis em
princípio”.
Então, se eu quiser conhecer uma outra versão minha, como chego lá?
Podemos viajar entre multiversos?
Infelizmente não. Os cientistas
não acham que seja possível viajar entre universos, pelo menos não ainda.
“A menos que um monte de física
que sabemos que está solidamente estabelecida esteja errada, você não pode
viajar para esses multiversos”, diz Siegfried. "Mas quem sabe? Daqui a mil
anos. Não estou dizendo que alguém não pode descobrir algo que nunca teríamos
imaginado.”
Existe alguma evidência direta sugerindo a existência de multiversos?
Embora certas características do
universo pareçam exigir a existência de um multiverso, nada foi observado
diretamente que sugira que ele realmente exista. Até agora, as evidências que
apoiam a ideia de um multiverso são puramente teóricas e, em alguns casos, filosóficas.
Alguns especialistas argumentam
que pode ser uma grande coincidência cósmica que o Big Bang forjou um universo
perfeitamente equilibrado que é perfeito para a nossa existência. Outros
cientistas pensam que é mais provável que existam vários universos físicos e
que simplesmente habitemos aquele que tem as características certas para nossa
sobrevivência.
Um número infinito de pequenos
universos de bolso alternativos, ou universos bolhas, alguns dos quais têm
física diferente ou diferentes constantes fundamentais, é uma ideia atraente,
diz Kakalios. “É por isso que algumas pessoas levam essas ideias a sério,
porque isso ajuda a resolver certas questões filosóficas”, diz ele.
Os cientistas discutem se o
multiverso é mesmo uma teoria empiricamente testável; alguns diriam que não,
dado que, por definição, um multiverso é independente de nosso próprio universo
e impossível de acessar. Mas talvez não tenhamos descoberto o teste certo.
Será que algum dia saberemos se nosso universo é apenas um entre
muitos?
Pode ser que não. Mas os
multiversos estão entre as previsões de várias teorias que podem ser testadas
de outras maneiras, e se essas teorias passarem em todos os testes, talvez o
multiverso também se mantenha. Ou talvez alguma nova descoberta ajude os cientistas
a descobrir se realmente existe algo além do nosso universo observável.
“O universo não é limitado pelo
que algumas gotas de protoplasma em um pequeno planeta podem descobrir ou
testar”, diz Siegfried. “Podemos dizer: isso não é testável, portanto, não pode
ser real – mas isso significa apenas que não sabemos como testá-lo. E talvez
algum dia descobriremos como fazer, e talvez não. Mas o universo pode fazer o
que quiser.”
Fonte: Nationalgeographic Brasil
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